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terça-feira, 24 de março de 2009

A última tesourada


“Fala-se muito em decoro parlamentar. Eu não sei o que é decoro com um barulho desses enquanto a gente fala. Aqui parece um mercado. Isso aqui representa um país. Nem na televisão, que é popular, se faz isso.” Clodovil Hernandes, em seu primeiro discurso na Câmara Federal.

Clodovil Hernandes, deputado federal, estilista e provocador nato, morreu terça-feira(10), em Brasília, vítima de um acidente vascular cerebral aos 71 anos. A jornalista Maristela Bairros, em seu blog, lamenta a ignorância de muitos brasileiros sobre a importância de Clodovil. “Polemista, anárquico, exagerado em suas atitudes pessoais, mas acima de tudo, um grande criador”. “Era mulatinho, beiçudo, não tinha quem sabe tipo físico nem para ser costureiro no entender de muitas madamas e seus bichos muito loucos. Mas venceu. Ficou famoso. Foi grato aos pais adotivos até o final da vida. Era recalcado? Possivelmente. Não é fácil ter seu biotipo, ser homossexual e ao mesmo tempo inteligente e destacado. A inveja mata. Fosse aqui a França, e ele teria sido um Yves Saint Laurent mulato, adorado e respeitado. Ficou, danou-se”.

Acredito que não tenho sido uma danação a vida do polemista Clodovil. Ao desistir da alta cultura, abrangeu um público maior. E acredito que era justamente isso o que pretendia. Colocou velhas raposas da política nacional em situações, no mínimo constrangedoras varias vezes. E tinha projetos bacanas como o aprovado pela postumamente pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que autoriza o enteado a adotar o sobrenome do padrasto ou da madrasta, desde que não retire os sobrenomes originais. A matéria ainda precisa ser aprovada pelo plenário antes de ir à sanção presidencial, caso não seja alterada.

A medida pode oficializar uma prática da Justiça, mas sem previsão legal. Em 2000, o Superior Tribunal de Justiça autorizou a inclusão do sobrenome do padrasto no registro de duas mulheres adultas, que tinham o pai biológico ausente. O caso foi para instância superior depois de o Ministério Público de São Paulo ter questionado a falta de norma jurídica.
Clodovil que fora adotado e amava os pais, imigrantes espanhóis, sabia o quanto era importante esse reconhecimento. De qualquer forma, com exageros ou não, fica a lição de que volta e meia, é precisa tirar a máscara, olhar bem no fundo da lente da verdade – como diria Clo – e sapecar a vida de brilho e irreverência. Porque as convenções fechadas em sua clausura esperta, tornam o cotidiano um medíocre repetir-se. E quem ganha com isso?

quinta-feira, 5 de março de 2009

A infinita capacidade humana de achar sarna para se coçar


Enrolados em problemas, situações mal-resolvidas e toda sorte de chateação, os habitantes considerados racionais do planeta Terra, tem uma capacidade interminável de andar em círculos. Inacreditável é ainda a dificuldade para visualizar soluções. Ou pior, quando sabe qual a melhor atitude , o medo impede a libertação. Muito medo. Quebrar a rotina da dor, da humilhação imposta por terceiros é como chegar bêbado a beira de um penhasco onde, lá embaixo, estão as ameaças, intimidações ou pior, os próprios temores íntimos a gritar “Não faça isso, deixa assim!”

E aí, a vida destes bípedes doidos por desfrutarem as coisas boas, transforma-se em um contraditório acorrentar-se em carências e angústias. O resultado é a ilusão da fuga. Lá vão machos e fêmeas, a escapulir entre as grades criadas com as próprias mãos. Saem às escuras em busca do prazer, da realização e acabam melados no açúcar da culpa. O risco de danos é muito maior. Voltam à masmorra com um breve sabor de satisfação. Deixam rastros, impressões digitais, mentiras digitadas.

Toda insatisfação deve ser resolvida na hora certa. Mas quando chega essa maldita hora? Muitas vezes, tais fugas acontecem como acidentes de percurso a provocar danos maiores do que o simples encarar da realidade. O peso cada vez aumenta mais, a responsabilidade se torna um fardo a ser arrastado e o cotidiano um suceder de sustos. Seres estranhos que seguidamente pedem socorro às pessoas erradas e se irritam quando escutam o que não querem. Imagino o tortuoso caminho de volta ao começo que muitos precisam fazer para recompor a própria história, a dignidade rompida. O maior desafio nunca é enfrentado contra um oponente mais forte, mas contra a própria imagem.

Lembro a frase genial do beatle John Lennon na canção de ninar que escreveu para o filho Sean: “A vida é aquilo que acontece enquanto você está ocupado fazendo outros planos”. Ou seja, na maioria das vezes falta foco. O que seria importante manter, sei lá, um emprego, uma relação afetiva, não era na verdade o melhor. Seres complicados...

De qualquer maneira, sempre existe uma alternativa e uma lição a ser aprendida a cada quebra de paradigma. Enganos ficam no passado. Como alerta, advertência. O ideal é voltarmos a esse grande sanatório existencial dispostos a viver o real. Projetos vazios que durmam na lixeira. E aí, naquela bendita hora certa que falei acima, serão definitivamente apagados. Afinal, uma vida com remorsos e culpas, não tem a menor graça. Qualquer humano sabe disso. Ou não?